Havia se passado dois anos desde que sua alma gêmea desencarnara em um trágico acidente entre seu carro e um caminhão.
A saudade era o que doía, a vontade de tê-lo por perto, de que ele pudesse ver seu filho crescer, de poder dividir suas vitórias e alguns fracassos temporários com ele. Não podia mais. Mas sabia que era questão de tempo até se reencontrarem em outro plano, ou em outra vida.
Ela seguia sua vida aqui na Terra, mas não era tão alegre como antes. Não tinha o mesmo brilho no olhar. Às vezes passava horas chorando. Não era totalmente infeliz, mas sentia saudade. Lutava por sua felicidade. Tentava trabalhar, cuidar da criança de apenas 3 anos. Seguia firme, embora aquele caminhão tivesse levado uma parte de sua paz.
Resolveu, porém, numa tarde em seu escritório, aceitar o convite de uma amiga para seu aniversário. Seria uma festa em uma casa noturna, lugar que ela não ia desde que se tornara mãe. Pouco antes, ainda grávida, foi comemorar os trinta e dois anos do marido.
Ligou para sua mãe, pediu que ficasse com seu filho naquela noite. A mãe se animou, nem acreditava no que acabara de ouvir. Aceitou na mesma hora, pediu apenas que esperasse por confirmação.
Naquela noite foi quando se conheceram. O novo ele era divorciado. Ela sabia que podia que namorar e que estar com alguém não seria pecado, não haveria traição. Ele queria que ela fosse feliz. Ela queria ser feliz. O novo ele era interessante e logo teve vontade de conhecê-lo melhor, apenas aquela vozinha dizia que não deveria fazer isso. Besteira, ela sabia que era o certo a fazer.
Naquela noite, o novo ele conquistou sua simpatia e curiosidade. Passaram a maior parte do tempo conversando, rindo, contando suas histórias. Ela não tirara a aliança do falecido marido, então teve que dizer logo de cara que era viúva, pois ela queria que o novo ele soubesse da informação. Não entraram em detalhes. A noite foi agradável.
Nunca iria amar alguém como o amou, ela pensava. Nunca. Eles eram almas gêmeas, ela sabia disso. Ele também. Ele a amava profundamente. O amor deles era lindo, sereno, sincero. Não tinha cobrança, não tinha dúvida nem ciúme. Tinha brigas e muitas. Nunca amaria alguém como amava ele.
Mas o novo ele estava se aproximando. Depois da festa, a levou pra casa e trocaram telefones. Tinham muita coisa em comum.
Dias depois, mais um encontro tiveram e começaram um romance. Foi difícil para ela começar a se entregar. Não conseguia deixar de pensar nele e o novo ele estava tentando ser compreensivo - sinal de que o novo ele valeria a pena.
O filho deles gostou do novo ele. Passavam muito tempo juntos. Começaram a namorar. Assumiram nas redes sociais. As pessoas ficaram felizes por ela. E ela estava feliz. E o novo ele era realmente legal. Mas sabia que ela não o amava como amou o antigo ele. Mas ele não se importava, compreendia.
A mãe do antigo ele se surpreendeu positivamente quando ela entrou em contato para contar a novidade. Convidou ela para que o conhecesse, saíram todos para o teatro: ela, ele, o filho, a mãe e o pai do antigo ele, avós da criança. Ficaram felizes ao vê-la feliz. Mas sabia que o antigo ele não saía de seu coração e isso os deixava ainda mais feliz. A lembrança do filho único iria durar pra sempre. O neto não esqueceria do pai, ainda que não pudesse se lembrar.
Passaram muito tempo juntos, se descobriram muito afinados. Foram morar juntos e tiveram uma filha. Os quatro viveram muito bem, entre brigas e algum ciúme, existia amor, de ambas as partes. Mais dele. Menos intenso dela. O antigo ele nunca fora esquecido. Alma gêmea, eles eram. É o amor que transcende a matéria, o plano terrestre. Mas ela encontrou a paz novamente com o novo ele. E foi assim o antigo ele poderia, então, seguir em paz, esperando o próximo encontro entre as almas gêmeas.
"Foi ele que te colocou na minha vida, posso de novo ser feliz", dizia ela em vida, "obrigada, meu companheiro terrestre", disse para ele antes de desencarnar, já velha. E se encontraram, as almas gêmeas.