Todos os dias ele tinha que falar do meu cabelo, ou era sobre eu ser parecida com a ex namorada dele, menos a parte do cabelo, ou que meu cabelo era feio, ou que ele era ruim, ou que ele não era feio nem ruim, só era curto demais, nunca era um elogio, mas na verdade não era uma ofensa, só era… A gente! E ele sempre dizia para eu tirar o cabelo do rosto.

Conversávamos sobre tudo, principalmente sobre o meu cabelo, isso por que ele não tinha problemas com o dele, já que era sempre liso, comportado, macio e sem nenhum nó. Eu adorava quando ele deitava no meu colo e eu ficava horas acariciando aqueles montes de fios pretos, e ele sempre dizia para eu tirar o cabelo do rosto.

O cabelo dele estava mais curto e mais bonito n uma tarde, ele disse que o estava assim por que ele não o penteou e agradeceu por que eu fui a única que percebeu que ele tinha cortado, ele dava importância para as coisas pequenas. Eu me lembro desse dia, eu tranquei a gente no banheiro, ficamos olhando no espelho um para o outro, eu queria arrancar informações sobre um amigo dele de quem eu gostava e ele ficou enrolando, enrolando, acho que era ciúme, alisando seus cabelos ainda mais, e ele sempre dizia para eu tirar o cabelo do rosto.

Ele sempre me perguntava por que eu não fazia algum tratamento no meu cabelo, jogava alguma química por que eu poderia ficar… mais… bonita. Como a da ex dele, talvez? Depois que eu tirei o vermelho e passei a usar o preto natural neles, fiquei ainda mais parecida com ela! E ele sempre dizia para eu tirar o cabelo do rosto.

Um dia eu tinha seus cabelos pretos e lisos e curtos e bagunçados no meu colo, no outro, eles tinham sumido, e foi assim por uns dois meses inteiros, eles fizeram tanta falta que minhas mãos ficaram secas e desacostumadas a fazer cafunés, então ele não disse, por dois meses, para eu tirar o cabelo do rosto.

Alisei, cortei chanel e ele sumiu, e eu queria sumir, mesmo tendo alisado… e ficado… muito… mais… bonita - ah, não parecia a ex namorada dele, ela não tinha um cabelo chanel – ele ainda não estava na minha vida.

Um dia nos esbarramos por acaso e ele sorriu. Por que sorriu é um mistério, sei que debaixo daqueles cabelos, dois dedos maiores que do último encontro, no rosto e a barba mal feita do dia, e tinha o mais iluminado sorriso, todos sorriam pra mim, mas o dele era o mais bonito, acho que por que eu estava, bem, um pouco mais bonita. Não disse nada, além, é claro, de que ele estava bonito daquele jeito por que eu não havia penteado no dia.

Eu não sorri! Eu não! Por que iria sorrir? Estávamos afastados, ele tinha motivo – o tal motivo desconhecido – mas depois de uns dias eu fui cedendo, ele foi pedindo trégua, os dias se passaram e ele resolveu elogiar, disse que preferia que ele tivesse comprido – como o da ex dele -, mas que estava bonito. Sim! Não disse “não tão feio”, ele disse bonito! Nesse dia ele não disse nada, ele só tocou no meu rosto, tirou minha faixa do cabelo, colocou minha franja para trás da orelha, e sorriu, apenas sorriu.

Depois voltamos a conversar sobre tudo, bem, quase tudo, o assunto do cabelo ficou para trás, é, só o assunto, por que os cabelos continuavam a cair pra frente. Sempre dando qualquer desculpas pra tirá-los dos meus olhos, ele dizia que eu ia ficar vesga procurando uma fresta no cabelo, ou então por que cabelo no rosto aumentava a espinha, mas o motivo real eu acho que era para ele poder olhar meu lábios, meu nariz e meus olhos.